Vem, a Poesia, eu vos conto, rastejando por entre o lixo, como um gato à procura de qualquer coisa...
CUSCUVILHAI! CUSCUVILHAI!... QUE NESTE BLOG QUASE TUDO SE PASSA NOS COMENTÁRIOS!
Isto pode parecer um concurso e é, de facto, com o que mais se parece

Olá amigos, é o professor Saraiva quem vos fala! E, à primeira vista, isto pode parecer um concurso e é, de facto, com o que mais se parece, pelo menos, à primeira vista, no entanto, seria mais correcto compará-lo com outra coisa qualquer. Como de momento não me lembro o quê, chamemos-lhe um ponto de encontro de almas sensíveis e mentes abertas ao apelo da grande Arte Poética.

Ora, num contexto destes, pensar-se em prémios e gratificações é de uma mesquinhez inqualificável, de merdosa. Haveria de servir-vos de consolação e júbilo o serdes publicados neste espaço de tão requintado gosto e exigente gabarito, mas, já andamos nisto há muito tempo e sabemos do que a casa gasta, por isso é bem provável que vos ofereçamos uma qualquer lembrança, ou singelo regalo, como prémio e distinção...

Até lá, que deus vos cubra!

mais uma semana de 9 dias

Olá amigos, é o professor Saraiva quem vos fala, desta feita para vos anunciar que a extensão da semana se deve à praia, mas se foi porque adormeci na praia, se foi porque apanhei um escaldão, se foi porque apanhei uma indigestão de cadelinhas ou uma grande cadela, ou por outra razão qualquer, pois bem, não tendes nada a ver com isso! Satisfazei-vos, pois, com esta lacónica satisfação que vos dou, até porque é a que consegui arranjar e quem dá o que arranja, a mais não há quem o constranja.
Agora o prémio desta semana é que, vou-vos dizer, foi muito complicado, devido à altíssima qualidade de todas as poesias a concurso. Depois de muito reflectir – ai, o me doíam as têmporas de tanto tempo reflectir… –, decidi aplicar uma fórmula muito especial que guardo para estas ocasiões e que é a seguinte: p=u-1, em que p se lê “primeiro” e u se lê último. Traduzida em linguagem mais chã, a fórmula que usei foi, portanto, “os penúltimos são os primeiros”. Esta fórmula funciona sempre muito bem e esta vez não foi excepção, porque me levou, de facto, a escolher para o primeiro lugar a poesia vencedora:

Raspas, Limão de Cima, Brisas Fescas, Geralmente

o que arde diz que sara
o que sara diz que cura
o que avança diz que pára
promete o que diz que jura

o que arde diz que sara
deve ser a parvoíce
talvez mesmo a mais ignara
que alguma vez alguém disse

o que sara diz que cura
ora aí está outra vez
o que se me afigura
ser mais uma estupidez

avança o que diz que pára
eu aqui nem digo nada
já que é por demais clara
a palermice chapada

promete o que diz que jura
é a cereja no bolo
p'ra completar a figura
no caso figura de tolo


e se ela pagasse imposto
a parvoíce a granel
já tinhas quase que aposto
p'ra comprares um hotel.

Será portanto este nosso blogospectador que receberá um magnífico cinzeiro todo alcatifado que tornará muito mais acolhedor o seu lar.

Em segundo lugar, temos, eh Zeco!, as outras poesias todas, cujos autores receberão, por isso, dois degraus de escada rolante cada um. A escadaria rolante de 16 degraus está já à vossa disposição do estação do Rossio, onde eu já a fui colocar à bocadinho, restando-vos apenas a cada um, mediante a devida identificação a um funcionário do Momento de Poesia que se encontrará no local devidamente identificado ele também, desmontar dois degraus dos 16 e levar para vossa casa. Escusado será dizer que o último a chegar é o que terá menos trabalho…

Duarte de Cavalgar e Todacela, Barreiro, ao pé das bombas

o que arde diz que sara
o que sara diz que cura
o que avança diz que pára
promete o que diz que jura

julião era bombeiro
passava a vida a bombar
a bombar o dia inteiro
de manhã ‘té ao jantar
do jantar até à ceia
porque isto a vida ‘tá cara
p’r’acudir ao pé de meia
o que arde diz que sara

diz que sara diz que ajuda
que sempre é um aconchego
enquanto a sorte não muda
não havendo melhor emprego
diz a sara, a mulher dele,
que ele bem tenta e procura
e faz-lhe festas no cabelo
o que sara diz que cura

mas ela sabe também
do mundo as contradições
bomba um tipo e dá-lhe bem
e não vê compensações
e ninguém se chega à frente
não se vê quem dê a cara
se há quem repare na gente
o que avança diz que pára

para a pata que os pariu
é o que apetece dizer
às vezes ‘té desconfio
que p’ra isto se resolver
só arreando o escarcéu
como se fez com a ditadura
o primeiro era logo eu
promete o que diz que jura

Nélson Almirante Reis, Penha de França, Lisboa

Eu cá nem faço por mal
São as cartadas da sorte:
Se dá a música à morte
Que é qu’ele espera afinal?
Afano-lhe o cabedal
E ele em nada repara
Só lhe faz bem, grand’arara
Qu’em ficando a arder agora
Logo a vida lhe melhora
O que arde diz que sara…

Quando a Sara se levanta
Como é doente, coitada
Dá-lhe uma sede malvada
Que lhe apoquenta a garganta
Mas ela não se ataranta
Vai um de três com mistura
Passa-lhe logo a secura
É barato e sem receita
Serve p’ra toda a maleita
O que Sara diz que cura

A história passa-se assim:
O gajo vem-me afanar
C’o fogante a ameaçar
E avança para mim
Tento evitar, mas enfim,
Como ele diz que dispara
Leva um estalo na cara
E o passo que deu em frente
Volta p’ra trás de repente
O que avança diz que pára

Não que eu seja vigarista
Até antes p’lo contrário
Mas se aparece um otário
Que me sorria e insista
Que o que ele quer é alpista
Dou-lhe aquilo que procura
Na sua alegre candura
Cá p’ra mim vai de popó
Até porque a gente só
Promete o que diz que jura

Sura Cara Ammays Barata, Reboleira, Cidade Jardim, Amadora

«O que arde diz que sara,
o que sara diz que cura…
Ai, e a mim quem me dera
que houvera quem me sarara
com a sua tanta doçura
a ferida que dilacera
a minh’alma doce e pura!
Ó que fogo me devora,
me perturba, desampara,
me faz perder compostura!
Compreende-me a senhora?»,
perguntava à dona Sara
o senhor seu padre-cura.

«O que avança diz que pára,
promete o que diz que jura,
mas que se cuide a mentira,
porque pronto se declara
a quem a jura descura
de Deus a suprema ira
que castiga a impostura.
Quem só da boca p’ra fora
fala, melhor se calara!»,
diz a Dona Sara ao cura,
«Diga então e sem demora:
Promete que, se não pára,
Avança mesmo? Sim? Jura?»

Américo do Sul e Ilhas, Esparregado

o que arde diz que sara
a minha mão na tua cara
o que sara diz que cura
palha seca não é verdura
o que avança diz que pára
mas quem passa nem repara
promete o que diz que jura
mentirosa criatura

e o que sara diz que arde
antes cedo que mais tarde
o que cura diz que sara
se não for doença rara
o que pára diz que avança
logo à frente vai a pança
diz que jura o que promete
cinco vezes doze dezassete

o que arde já ardeu
diz a sara e digo eu
o que cura é o fumeiro
trás o pão e molha no cheiro

e se avança ou fica assim
quem jura e faz o contrário
é uma raça p’ra mim
que nem merece comentário

Fácil Não Tenho

"Gasóleo na noite escura"

josé antónio nunca disse
que não queria um pãozinho com manteiga
vacas à solta pastavam-lhe por entre os grelos cosidos do cabelo
tenho mais em que pensar - rugia entre favas
o meu quintal é o centro do universo
não me importa sol ou sombra
todos os vermes são filhos de deus
as minhocas é que são filhas da puta
e as formigas é outra conversa
quando o sol bate com os costados no zinco do telhado
amélia vem à janela e começa a dizer disparates
o que arde diz que sara
o que arde diz que sara
ninguém lhe liga e alguns jogam-lhe pedras e pevides
o que sara diz que cura o que sara diz que cura
cala-te cavalgadura
atiram-lhe em ferradura
a mulher do padre cura mais a coxa do Belmiro
uma velha meio louca
que lê a sina nas tripas
e nas cascas das santolas
e o que avança diz que pára
olha para trás e hesita
três gagos saem da esquina
a comer batata frita
a zanaga do Belmiro cospe no chão e tropeça
os gagos lançam suspiros até encher uma travessa
promete o que diz que jura
acendem-se as lamparinas
gasóleo na noite escura

Mr. X

O corredor em pedra
como um exemplo a seguir
do que ainda deve ser feito
e, diga-se desde já,
as condições necessárias
as condições necessárias
nas suas respectivas áreas
O que arde diz que sara

os losangos da placa central
num material ainda a definir
a sua intenção não é transformá-lo
fazer um piquenique com sardinhas
umas sombras e uns bancos
mesmo desmontáveis ou algo assim
mas não querem saber
O que sara diz que cura

não estiveram presentes
faltaram também os outros
e fizeram correr o sangue
ao longo da costa, desde a fronteira
será ainda possível estabelecer contacto?
responder em tempo útil?
não foi ontem possível apurar
O que avança diz que pára

de forma dissimulada,
burla qualificada,
explicou a filha da pianista,
com problemas semelhantes,
a impossibilidade de recomeçar do zero
premiado e traduzido
comparando-o a um líder mafioso
promete o que diz que jura

Cardoso, Ginjal

“Laurinda não faças merda”

o que é doce não amarga
o que pica faz coceiras
Laurinda não faças merda
não arranhes as cadeiras
o que arde diz que sara
e não te digo mais nada
tu sabes bem do que falo
não te armes em distraída

o que vale é que as montanhas
não saem de onde estão
Laurinda não faças merda
aplica-te no acordeão
o que sara diz que cura
mete-me isto na cabeça
acredita que ainda acabas
um dia por me agradecer

e agora vamos lá
a falar de coisas sérias
Laurinda não faças merda
que já basta de misérias
o que avança diz que pára
só que este não parou
e mandou para o cemitério
a tua mãe e o teu avô

por isso vê lá se tu
atinas aí em França
Laurinda não faças merda
és a última esperança
promete o que diz que jura
esta frase é um mistério
mas faz uma criatura
perceber que o caso é sério


Jorge, Seixal

O QUE ARDE,
sei dizer
que a gente o sente arder.
DIZ QUE SARA.
Há-de se ver...
Vá lá a gente saber
O QUE SARA
ou que não sara
ou em que é que a coisa pára…
DIZ QUE CURA.
Pode ser.
O que se sente é arder…
O QUE AVANÇA,
se é p’rà frente,
é uma coisa inteligente!
DIZ QUE PÁRA.
É p’ra ganhar
mais balanço p’ra avançar!
QUEM PROMETE,
a bem dizer,
só p’lo facto de o fazer,
DIZ QUE JURA
(sem contar
quem promete não jurar…).

Quanto ao mote da próxima semana, vede aí na caixinha arriba, se fazeis o favor, sim?

Sem comentários:

Enviar um comentário